"Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar do calor."

Amyr Klink

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

MENDOZA, CORDILHEIRA DOS ANDES, DEZEMBRO DE 2013, 3º DIA

3º dia, sexta feira, 06 Dez 13


   Dia de ALTA MONTANHA ! Hoje o plano é seguir pela RN7 até a divisa com o Chile, visitar o Parque Provincial Aconcagua, cruzar o Tunel Cristo Redentor, colocar os pés no Chile, e conhecer o que mais houver de atrações neste caminho (e são muitas, o dia vai ser pequeno).

   O dia amanheceu perfeito, com um céu completamente limpo e azul sobre a silhueta da Cordilheira dos Andes no horizonte. Sem perder tempo, acordei cedo e após um rápido mas reforçado café já estava na RN7 em direção às montanhas.

A caminho da Cordilheira

   A paisagem no entorno da estrada é simplesmente sensacional, paradas para fotos e admirar a paisagem são constantes, por isso quem for planejar fazer esta viagem deve reservar bastante tempo, para curtir cada curva, cada montanha. Este é um passeio para ser feito sem pressa, mesmo.



Montanhas coloridas contrastando com o céu na região da pré cordilheira


   Seguindo a RN7 em direção à fronteira passamos pelo pequeno vilarejo de Uspallata, distante 130 km de Mendoza. Segui direto, Uspallata e região merecem um dia inteiro de visita e está na sequencia do roteiro de minha viagem.

Chegando a Uspallata, muitas árvores em meio a uma região semi-desértica

   Após Uspallata a paisagem começa a mudar um pouco, deixamos a aridez da Pré Cordilheira para trás e aos poucos começamos a subir os Andes. Uspallata está a 2.000 msnm, já uns 500 m acima da região de Mendoza, mas ao final da viagem na região de fronteira com o Chile chegaremos a 3.000 msnm de altitude media. À medida que avançamos em direção à região de fronteira, a temperatura vai caindo (mesmo assim faz muito calor) e o vento sopra cada vez mais forte.


    Finalmente após 250  km e pouco mais de 3 horas de viagem, chegamos à portaria de acesso do Parque Aconcagua. 


   O visitante deve se identificar no Centro de Visitantes, pagar uma pequena taxa (20 pesos), e então seguir de carro até a área de estacionamento.


   O Parque Aconcagua possui diversas opções de trilhas, de acordo com o tempo e o nível de preparo físico do visitante. As trilhas “comuns” e abertas a todos os visitantes são a Trilha do Mirante, 1 hora de caminhada e 1,5 km de distancia, e a Trilha até Plaza Confluencia, 4 horas de caminhada .


   As outras opção são o trekking até Plaza Francia, já a 4.200 msnm, mais 5 horas a partir de Confluencia, ou Plaza de Mulas, este a 4.400 msnm, 10 horas de caminhada a partir de Confluencia. 
Plaza Francia e Plaza de Mulas são caminhadas exigentes, e os pontos de chegada servem de “campos base” para quem vai encarar a escalada até o pico do Aconcagua.

   Como estou sozinho e não sou alpinista, optei pela caminhada curta da Trilha do Mirante do Aconcagua. A trilha é bem sinalizada, e a dificuldade é baixa. Existem duas surpresas porém....uma, o vento absurdamente forte e gelado, que obriga o visitante a vestir ao menos um agasalho leve ou moleton para se abrigar. A outra é o cansaço e a dificuldade de caminhar, já aqui a partir dos 3.000 msnm. Sim, a famosa sensação de cansaço ao fazer esforço físico já aparece aqui, a altitude média. Fico pensando no que enfrentam os aventureiros que seguem até a Plaza de Mulas J

Na trilha a caminho do mirante do Aconcagua

   A trilha do Mirante, como o nome faz supor, leva a um ponto de onde se tem uma espetacular visão da parede sul do Monte Aconcagua, o “Sentinela de Pedra”, que com seus 6962 m é o ponto culminante das Americas e montanha mais alta do mundo fora do Himalaia.

As primeiras visões do "Sentinela de Pedra"

   Majestoso talvez seja o adjetivo mais adequado para descrever o Aconcagua. Do mirante a visão que se tem é de uma montanha imponente, com seu pico coberto de neve.



   Não há como deixar de se deslumbrar com a força e imponência do Sentinela de Pedra. Não há como reproduzir através de fotos o que se vê ali. Na falta de palavras, a melhor opção é sentar e deixar o tempo passar sem pressa, sentindo o frio do vento da montanha mais alta das Americas enquanto admiramos a maravilha da obra da natureza. O Aconcagua é uma daquelas visões que a gente tem de guardar num registro muito especial na memória, em todos os detalhes, pois é algo muito especial e que não será esquecido durante o restante da vida.

Face sul do Monte Aconcagua

    Na descida do mirante em direção ao estacionamento, a trilha passa ainda pela Laguna de Horcones, uma pequena lagoa de águas incrivelmente verdes, muito bonita e que também rende belas imagens.

Laguna de Horcones, na trilha de acesso ao mirante do Aconcagua


   Espetáculo do Parque Aconcagua encerrado, segui em frente pois ainda havia muita coisa a ser vista, e a manhã já havia passado inteira. A fronteira com o Chile fica a pouco mais de 20 km da portaria do parque, e em pouco tempo já estou cruzando o Tunel del Cristo Redentor. São uns 3 km de túnel cruzando por dentro da montanha, levando do outro lado ao Chile. 


Chegando ao Tunel Cristo Redentor, fronteira Argentina x Chile

   A aduana de entrada no Chile fica bem adiante da saída do túnel, alguns quilômetros a frente, então dá para cruzar o túnel, “colocar os pés em solo chileno”, ver e fotografar as montanhas do lado chileno e retornar à Argentina numa boa.

Fila imensa de carros e ônibus na aduana chilena


Túneis entre as montanhas no lado chileno da cordilheira

  
   De volta ao lado argentino, aproveitei para almoçar na pequena Villa de las Cuevas, o ultimo ponto habitado no lado argentino, quase na entrada do túnel de fronteira. Buffet simples de comida caseira a 85 pesos.

Las Cuevas

    Las Cuevas é o ponto de partida para o acesso ao Monumento Del Cristo Redentor, uma estatua erguida no inicio do século passado no ponto mais alto da antiga travessia de fronteira entre Argentina e Chile, no alto da montanha. Este era o caminho entre os dois países, antes da estrada atual e dos túneis que cortam a montanha, e sobe até impressionantes 4.000 msnm.


      A estrada até os 4.000 msnm é de ripio, e durante os meses de inverno costuma ficar fechada devido ao acumulo de neve. Questionei o simpatico atendente no restaurante em Las Cuevas sobre as condições da estrada, e obtive a nada animadora resposta de que a estrada estava fechada e que as maquinas ainda não haviam feito a limpeza e abertura da estrada até o topo da montanha. Mesmo assim, decidi arriscar, o que se mostra ser a decisão mais acertada que tomei em toda minha viagem.

   O inicio da estrada de acesso ao monumento do Cristo Redentor é marcada por uma espécie de “pórtico”, a 3000 msnm. 


   Poucos metros à frente o sinal de que o que vinha pela frente não era brincadeira......erosões e valetas enormes na estradinha quase impediam o pobre Golzinho de ir adiante, mas com calma e um pouco de técnica passamos o obstaculo e seguimos em frente. Montanha acima a estrada vai piorando a cada curva, era nítido que pouquíssimos carros haviam passado por ali nos últimos dias, mesmo assim segui adiante escalando com todo cuidado a montanha com a ajuda do valente Gol.

Ao alto, e avante !

Golzinho enfrentado o ripio dos Andes

    Aos 3.500 msnm acontece a grande surpresa da viagem. Começo a avistar placas brancas nas encostas da montanha e na beira da estrada montanha acima. Parecia inacreditável a principio, mas sim, era GELO acumulado !

Gelo !!!

   Segui subindo a estradinha até que aos 3.710 msnm, pouco menos de 3 km do topo da montanha, não teve jeito, a estrada estava completamente bloqueada pelo acumulo de neve e gelo, em pleno dezembro!



   Simplesmente fantástico meu primeiro contato com neve na vida, nem em sonho imaginei ter esta experiência em pleno mês de dezembro, mas o fato é que ainda existia MUITA neve acumulada nas partes altas da montanha e esse acumulo vai degelando e somente vai sumir de vez durante os meses de verão.

Muito gelo !


    Obviamente não pude deixar de aproveitar para curtir este momento tão especial ao maximo, caminhei sobre a neve, senti o frio do gelo nas mãos, fotografei tudo exaustivamente, curti a paisagem sem pressa, aproveitei o silencio da montanha para refletir, agradecer, e ao final de tudo retomei a estradinha descendo até Villa de las Cuevas, de onde segui pela RN7 em direção a Mendoza. 

Lá embaixo, bem distante, a pequena Villa Las Cuevas

Estrada de ripio no alto da montanha



   Mas o dia ainda não havia acabado e ainda havia algumas atrações muito especiais no caminho. A primeira delas fica na beira da estrada, a somente 3,5 km da portaria do Parque Aconcagua. Puente de Inca é uma interessante formação natural onde a natureza esculpiu uma “ponte” de pedra sobre o curso de um pequeno riacho.


   Junto à tal ponte estão as ruínas de um hotel construído no século passado e do qual hoje restam somente as paredes. O mais interessante de tudo é a cor fortemente amarelada das rochas por onde passa a água do rio. Não sou especialista em química, mas a cor típica de ferrugem deve indicar altos teores de oxido de ferro na água, ou seja abundancia deste mineral nas rochas da montanha.



   Junto à Puente del Inca há uma infinidade de pequenas barraquinhas de artesanato, onde se pode “garimpar” algumas lembrancinhas bem legais. Vale a pena perder um tempinho nas lojinhas e gastar alguns pesos.


   De volta à estrada em direção a Mendoza, apenas 1,5 km adiante temos o “Cementerio de los Andinistas”, que nada mais é do que um singelo cemitério onde estão sepultados alpinistas que morreram em expedições e escaladas no Aconcagua e montanhas da região. 


   Atração um pouco lúgubre mas interessante, nos faz pensar na fragilidade e tamanho da vida humana quando confrontada à grandeza e força da natureza. Somos nada mais que grãos de areia diante da força e imponência da natureza.




   Por ultimo.........a estrada. A RN7 no trecho entre Mendoza e a divisa com o Chile é um espetáculo por si só. É o tipo de estrada que todo viajante deveria percorrer ao menos uma vez na vida. 

Um dos muitos tuneis na RN7 entre Uspallata e a fronteira com Chile

   Montanhas coloridas, tuneis, a paisagem semi desértica, a ferrovia e suas pontes que seguem paralelas à estrada, o rio Mendoza acompanhando a margem da estrada com suas águas ora turbulentas, ora calmas e quase secas, tudo isso realçado pela luz especial do final de tarde, fez com que a viagem de volta a Mendoza se transformasse num sem fim de paisagens inesquecíveis que renderam dezenas de ótimas fotos.




"On the Road"

    Enfim, chegando à cidade retornei ao hotel já com a luz do dia acabando. O dia foi cansativo, mas incrível. Se tivesse de retornar amanhã cedo para casa, diria que somente o que vi nestes dois dias iniciais de minha viagem já teriam valido a pena. Mas havia ainda bastante coisa para ver.

   Exausto, passei no Carrefour que fica ao lado do hotel, comprei um lanche simples e uma garrafa de um bom Malbec ao custo de 60 pesos e me refugiei no conforto do ar condicionado do hotel para descansar, saboreando as fotos do dia e o excelente vinho. O dia valeu a pena !

4 comentários:

  1. Olá Arlei, muito bacana este teu Blog. Também sou um apaixonado por carros antigos e tenho o blog www.expedicaonaestrada.com onde relato minhas viagens com os carros antigos. Em Abril de 2014 estarei viajando até ao Uruguai com a minha Chevrolet C-1416 (Veraneio - 1965). Acesse o nosso Blog e acompanhe as nossas aventuras pelo Facebook e Twitter. Abraços

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  2. Obrigado por compartilhar esse passeio. Literalmente "viajei" também lendo e olhando as fotos. Quem sabe um dia qualquer faço esse roteiro também. Valeu a dica, amigo.

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  3. Obrigado Arlei pelas informações do teu blog! Me inspirei nele pra organizar parte da minha viagem. Infelizmente o mau tempo não ajudou muito, e tive que abortar o caminho de Villavicencio. Também escrevo um blog e espero que seja de valia pra alguém como este teu foi para mim. Valeu! joaoebone.blogspot.com

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    1. João, uma pena que não pode fazer Villavivencio, o caminho é bonito demais.
      Quanto a teu blog....a tempos sigo ele e acompanho tuas viagens ;-)
      Abraços !

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